Por Charles Leadbeater
Será melhor que eu comece com uma declaração definida sobre o que eu pessoalmente sei a respeito da Mãe do Mundo, tratando dos fatos como eles são, e da maneira como eles nos interessam e influem no trabalho que temos de fazer – deixando de lado por ora todos os mitos que se agruparam em Seu redor.
A Mãe do Mundo, então, é um Ser grandioso que está à testa de um grande departamento da organização e governo do mundo. Em verdade Ela é um poderoso Anjo, tendo sob Suas ordens uma vasta falange de Anjos subordinados, a quem Ela mantém perpetuamente empregados no trabalho que Lhe cabe particularmente.
Este trabalho tem tantas e tão maravilhosas ramificações que não é fácil darmos sequer a ideia mais geral dele em poucas frases. Por enquanto bastará dizer que num sentido muito real Ela tem sob Sua responsabilidade todas as mulheres do mundo, e especialmente no tempo de sua provação maior, quando elas exercem a função suprema que Deus lhes confiou, ao tornarem-se mães.
Contam-se muitas histórias, especialmente entre os camponeses, de mulheres que viram a Mãe do Mundo ao seu lado naquelas horas cruciais, e muitas que não tiveram o privilégio de vê-La mesmo assim sentiram a ajuda e a força que Ela derrama.
Por que A veriam os camponeses, e não as pessoas mais intelectualizadas? Exatamente porque aqueles que se desenvolveram intelectualmente muitas vezes mergulharam naquela parte de sua consciência que exclui grande parte da impressionabilidade preservada pelos outros que vivem mais próximos da Natureza.
Não obstante, às vezes também os mais desenvolvidos A veem. Uma dama da nobreza inglesa me contou que sob circunstâncias similares ela também viu ao lado de seu leito um grande Anjo, que maravilhosamente provocou nela uma espécie de inconsciência, a fim de amenizar a dor em certos momentos.
Talvez seja esta Sua maior e mais impressionante função; mas Ela também tem uma outra que A leva para a mais estreita relação com a humanidade, pois Ela tornou parte de Sua obra tentar mitigar o sofrimento do mundo, agir como Consoladora, Confortadora, Auxiliadora de todos os que estão em atribulação, tristeza, necessidade, doença ou qualquer outra adversidade.
Para aqueles que são alheios a esta linha de idéias eu recomendaria a consulta de uma tocante história intitulada Consolatrix Afflictorum, no livroThe Light Invisible, do Monsenhor R. H. Benson, e também o livreto The Call ofthe Mother, de Lady Emily Lutyens.
Todos os estudiosos de Teosofia estão a par da existência da poderosa e gloriosa Hierarquia que constitui o Governo interno e espiritual do mundo. Quem deseja entender algo sobre esta organização faria bem em consultar um diagrama muito claro e útil que aparece como a Figura 118 em First Principies of Theosophy, de C. Jinarajadasa.
Deste diagrama vemos que enquanto o Rei Espiritual, o Senhor do Mundo, é supremo acima de todos, e o Senhor Buddha é Seu imediato como Líder espiritual do Segundo Raio, os outros cinco Raios (embora cada um seja governado por seu próprio Regente ou Chohan especial) estão todos reunidos sob a direção de um alto Oficial chamado Mahachohan.
Vemos então que o Senhor Manu Vaivasvata, o Senhor Bodhisattva Maytreia e nosso Senhor o Mahachohan atuam em um certo nível bem definido como representantes dos Três Aspectos do Logos Solar, até onde interessa ao trabalho nos planos inferiores; não conhecemos nenhum outro Grande Ser que esteja naquele nível exceto algum que, tendo desempenhado alta função no passado, agora trabalha em outro lugar.
Ficando assim esclarecidos os degraus da Hierarquia, e tabulado o arranjo dos diferentes Raios e seus Líderes ou Chohans, de imediato se verá que o trabalho da Mãe do Mundo não poderia ser incluído nesta lista, pois este trabalho não pertence a Raio nenhum em especial, mas atua de uma maneira protetora para as mulheres nativas de todos os Raios. Além disso, a lista dada aqui nos indica apenas as linhas de atividade do que podemos chamar de parte humana da Hierarquia.
Mas lembremos que o Senhor Maitreya é o Mestre dos Anjos assim como dos homens, e exatamente do mesmo modo o grande Senhor do Mundo é o Rei Espiritual não apenas da evolução humana, mas também do reino Angélico deste planeta. Sabemos que existe uma seção Angélica da Hierarquia, mas ainda não temos nenhuma informação que nos possibilite compilar para ela uma tabela semelhante.
Sabemos que assim como os Adeptos dividiram o mundo em paróquias, de modo que todas as nações têm algum tipo de orientação Adepta, igualmente cada nação tem um Deva ou Anjo presidente.
Sabemos, além disso, que os Anjos têm uma parte verdadeiramente grande na direção da evolução – que eles também presidem sobre certos distritos, e que há uma elaborada distribuição de Devas menores e maiores, chegando até o espírito local que atua como guardião para um bosque, um vale, um lago. Mas nosso conhecimento ao longo destas linhas é limitado e fragmentário, e a geografia política do mundo sob a ótica da Hoste Angélica ainda está para ser escrita.
Portanto, provavelmente seja temerário tentarmos uma comparação entre as pessoas altamente evoluídas de ambas as evoluções; mas imagino que não erraremos muito se considerarmos a Mãe do Mundo, Nossa Senhora da Luz, como igual em dignidade aos Chohans que são Líderes de Raios.
Temo que na maioria dos países de língua inglesa a principal dificuldade que devemos encontrar no caminho de tentarmos explicar o ofício e trabalho da Mãe do Mundo será o preconceito extraordinariamente acirrado e irracional do Protestante comum contra a doutrina Católica da Bendita Virgem Maria.
Inevitavelmente seremos acusados de tentarmos introduzir a Mariolatria, de tentarmos secretamente influenciar nossos leitores na direção do ensino da Igreja Romana, pois há uma vasta quantidade de equívocos ligados a este assunto. As Igrejas Romana e Grega envolvem o nome da Santa Virgem em profunda reverência, embora muitos de seus membros saibam pouco sobre o real significado do belo e poético simbolismo ligado a este nome.
A Igreja da Inglaterra limitou um pouco a reverência devida a Ela, enquanto que os outros Cristãos que não pertencem a esta comunhão usualmente consideram que é idolatria cultuar uma mulher -uma atitude mental que é o mero resultado da obtusidade e ignorância.
Se nestes assuntos realmente queremos entender a verdade, devemos começar libertando nossas mentes de todo o preconceito, e o primeiro ponto a compreender é que ninguém jamais cultuou uma mulher (ou um homem) no sentido em que o Protestante ultrajado usa a palavra.
Ele é incapaz de compreender – não quer compreender – a atitude Católica em relação a Nossa Senhora ou aos Santos. Nós que somos estudantes de Teosofia, contudo, devemos adotar uma posição melhor do que esta, e tentarmos descobrir o que de fato constitui a posição Católica antes de condená-la.
Citemos a Catholic Encyclopaedia (verbete ‘Culto’), que pode ser tomada como uma declaração aprovada e abalizada da Igreja Romana sobre o assunto:
“Há diversos graus de culto; se ele é dirigido diretamente a Deus, é culto superior, absoluto, supremo, ou culto de adoração, ou, de acordo com o termo teológico consagrado, um culto de latria. Este culto soberano é devido a Deus somente; endereçado a uma criatura, se tornaria idolatria.
“Quando o culto é dirigido a Deus, mas só indiretamente – isto é, quando o seu objeto é a veneração de Mártires, Anjos, ou Santos, é um culto secundário, dependente do primeiro, e relativo, pois ele honra a criatura de Deus por causa de suas relações especiais com Ele. Os teólogos denominam este como um culto de dulia, um termo de denota servidão, e implica, quando usado para significar nosso culto a ilustres servos de Deus, que seu serviço para Ele é o que constitui seu mérito para nossa veneração.
“Como a Santa Virgem tem uma posição separada e absolutamente principal entre os Santos, o culto a Ela dedicado se chama hyperdulia”.
Isto me parece tornar todo o assunto admiravelmente claro, e apresentar uma atitude correta e defensável. Já surgiu muita confusão derivada da tradução destas palavras gregas, com suas delicadas nuances de significado, pelo termo único “culto”. Acho que este erro, conjugado à completa ignorância da maioria das pessoas a respeito das sutilezas das distinções teológicas, e sua rapidez fatal em considerar mal a quem delas discorde, tem sido responsável por muitos mal-entendidos e seu consequente ódio.
Sugiro que entre nós e em nossa literatura façamos a distinção claramente, traduzindo como “culto” somente a latreia (aqui temos a versão grega real da palavra, a Encyclopedia usa a forma latina medieval); a douleia (igualmente esta é a forma grega real) poderia ser traduzida como “reverência” ou “veneração”, e hyperdouleia (o mesmo caso das outras palavras gregas) como “reverência profunda”.
Mas o ponto que devemos manter em mente é que nenhuma pessoa instruída jamais, em qualquer lugar ou tempo, confundiu a reverência devida e adequadamente oferecida a todos os grandes e santos Seres com aquele culto superior que só pode ser oferecido a Deus. Sobre isso não haja erro.
Já se falou muitas bobagens sobre idolatria, principalmente de parte de pessoas que são ansiosas demais por impor sua própria crença sobre os outros para terem ou tempo ou inclinação para tentarem entender o ponto de vista de pensadores mais sábios e tolerantes. Se eles soubessem o suficiente de etimologia para perceberem que a palavra “ídolo” significa “imagem” ou “representação”, talvez eles pudessem perguntar a si mesmos do que esta coisa é uma imagem, e se aquela Realidade não estará por trás daquilo que tantos selvagens mal compreendidos cultuam, em vez da madeira ou pedra de que os missionários falam tanto.
A imagem, a pintura, a cruz, o lingam dos shivaítas, o livro sagrado dos sikhs – todas estas coisas são símbolos, e não os objetos de culto em si mesmas, mas são veneradas por aqueles que entendem exatamente porque elas são designadas para nos recordar de algum aspecto de Deus, para voltarmos nossa atenção para Ele.
Na índia estes aspectos são chamados de inúmeros nomes diferentes, e os missionários se apressam em condenar os Hindus como politeístas, mas o serviçal que trabalha em seu jardim poderia lhes dizer que não há senão um Deus, e que todos aqueles são apenas aspectos d’Ele, são linhas para nos aproximarmos d’Ele, divididas e materializadas a fim de trazer a infinitude um pouco mais para dentro da compreensão de nossas mentes muitíssimo finitas.
Há muita necessidade de caridade, de compreensão, e de uma atitude simpática em relação aos outros que estão trilhando outra estrada até os pés do Deus em que todos acreditamos igualmente – o Pai amoroso de que nos fala Cristo, o Deus único e verdadeiro que disse através de uma outra de Suas manifestações: “Todo o culto verdadeiro chega a Mim, por diferente que possa ser seu nome”, e “Por qualquer via que os homens se aproximem de Mim, nesta mesma via Eu os encontro, pois todos os caminhos que os homens trilham são Meus”.
Não exista nada além de Deus, e para quem quer que sinta reverência, adoração, amor, é para o Deus manifesto através dele (em qualquer extensão em que isso ocorra) que esta reverência, adoração ou amor são oferecidos. “Tenho muitas ovelhas que não pertencem a este rebanho; estas também Eu reunirei, e elas ouvirão a Minha voz, e então haverá um só rebanho e um só pastor”.
Tendo assim tentado subir acima do miasma da ignorância e intolerância para o ar puro da justiça e da compreensão, neste espírito abordemos a consideração da bela e maravilhosa manifestação do poder e amor divinos que está por trás do nome da Mãe do Mundo.
Não penso que alguém com nossa educação ocidental considere fácil entender a pletora de simbolismo que é usado nas religiões orientais, e as pessoas esquecem que o cristianismo é uma religião oriental, assim como o budismo, o hinduísmo e o zoroastrismo.
Cristo assumiu um corpo judeu – um corpo oriental; e aqueles a quem Ele falou tinham métodos orientais de pensamento, e não os nossos. Em todas aquelas religiões eles têm um método de simbolismo muito elaborado e maravilhoso, e deleitam-se muito com seus símbolos; eles os movem e combinam, e tratam deles com amor na poesia e na arte.
Mas nossa tendência é mais em direção ao que chamamos de praticidade, e somos propensos a materializar estes ideais todos e, por conseguinte, os degradamos grandemente.
Jamais esqueçamos que nossa religião veio do Oriente, e que se queremos entendê-la devemos primeiro olhar para ela como um oriental olharia, sustando nossas modernas teorias científicas até que sejamos capazes de ver se são adequadas.
Elas podem ser tornadas adequadas, mas a menos que saibamos como somos mais sujeitos a confundir tudo, e corremos o sério risco de presumirmos que o povo que elaborou a alegoria não sabia de nada e estava irremediavelmente errado.
Eles não estavam errados. Aqueles belos e antigos mitos veiculam o significado sem necessariamente apresentar os fatos científicos crus diante daqueles que ainda não desenvolveram suas mentes para compreendê-los daquela forma. Isso era bem entendido na Igreja primitiva.
Há sempre muito mais por trás daqueles pensamentos originais e poéticos dos homens de antanho do que crê a maioria das pessoas. É tolice nos mantermos cheios de preconceito ignorante, muito melhor é tentarmos entender. O que quer que tenha sido artístico ou de ajuda em qualquer religião sempre teve por trás de si uma verdade. Cabe-nos desentranhar esta verdade, cabe-nos retirar as crostas dos séculos e deixar brilhar a verdade.
Isso vale para o belo símbolo Cristão da Bendita Virgem Maria. Há três ideias diferentes envolvidas no pensamento usual a Seu respeito:
– A história da mãe do discípulo Jesus; o que Ela era e o que se tornou depois.
– O mar da matéria virgem, o Grande Abismo, a água sobre cuja face se moveu o Espírito de Deus.
– O aspecto feminino da Deidade.
Estas ideias no decurso dos séculos se confundiram, degradaram e materializaram até o formato em que hoje a história se apresenta, e se tornaram inacreditáveis para qualquer pessoa pensante. Mas não seria assim se analisássemos e entendêssemos seu real significado, se separássemos o mito e o símbolo da crônica da pessoa viva.
A Igreja Romana ensina seus fiéis sobre o Nascimento Virgem de Jesus e sobre a Imaculada Conceição da própria Virgem em Sua mãe, Santa Ana. O primeiro destes eventos é contrário às leis da Natureza (que são as leis de Deus, expressões de Sua vontade) e portanto é impossível que tenha acontecido.
O segundo, imagino, usualmente é tomado (pelo menos por quem não teve maior instrução em teologia) como significando que Nossa Senhora foi concebida, assim como Seu Filho divino, pela sombra do Espírito Santo; mas consultando publicações Romanas autorizadas vi que não é assim, pois o ensinamento é que Ela foi concebida na maneira usual, como o resto da humanidade, sendo seus pais São Joaquim e Santa Ana.
É explicado que a doutrina da Imaculada Conceição significa somente que a mítica culpa prima do que eles chamam de pecado original (que se supõe herdado de Adão) não foi imposta por Deus sobre o embrião de Nossa Senhora.
Desejo ser absolutamente justo em minha exposição desta doutrina notável, mas devo admitir que ela me parece uma invenção teológica desnecessária e mesmo fantasiosa. Jamais encontrei a menor evidência histórica sobre a grotesca história de Adão e Eva e a maçã, e creio que toda a teoria sobre o pecado original é simplesmente um meio tosco de declarar o fato de que o homem traz consigo, de seus nascimentos anteriores, certa quantidade de karma.
Se tentarmos interpretar ao longo desta linha, talvez esta doutrina da Imaculada Conceição possa ser tomada como confirmação da declaração de que Nossa Senhora já havia esgotado todo o Seu karma negativo, e consequentemente entrou em Sua vida na Palestina praticamente sem karma algum. Mas não tenho dados sobre isso.
É um erro apresentar estas ideias como ocorrências factuais na vida de uma mulher judia; não poderia ter sido assim, e por isso não é verdade. Mas se as entendermos como símbolos de certo estágio no processo da Criação, da evolução de um sistema solar, elas encontram seu lugar naturalmente, e são vistas como belas e significativas. Despida delas, a história da vida se torna coerente e crível.
A mesma Igreja tem a Festa da Assunção como comemorativa da elevação de seu corpo físico para o céu – mais uma vez uma impossibilidade patente; mas quando percebemos que isso é só uma descrição poética da entrada de um Adepto triunfante no Reino Angélico, vemos de imediato a adequação de tudo que já se escreveu a respeito, e das maravilhosas pinturas que já inspirou.
Primeiro de tudo, então, consideremos a vida física de Nossa Senhora da Luz, e as consequências que a seguiram e A conduziram a aceitar ao Ofício em que Ela hoje atua.
Deve ser entendido que o discípulo Jesus nasceu exatamente como nascem os demais humanos. Esta estranha doutrina da Imaculada Conceição, uma tentativa de explicar a história da fertilização da Santa Virgem pelo Espírito Santo – todo este grupo de ideias se refere a um mito, a um símbolo; tem um significado real e uma bela interpretação, que logo tentarei demonstrar, mas não tem nada a ver com o corpo físico do discípulo Jesus.
A mãe daquele corpo físico era uma dama judia de berço nobre, mas, segundo a tradição, de parcos recursos. Não precisamos pensar em José (que também, lembremos, era da estirpe de Davi) como carpinteiro, pois isso é parte do simbolismo, e não da história.
Neste simbolismo José representa o Guardião da Santa Virgem, que é a alma do homem. Ele representa a mente, e porque a mente não é o criador da alma, mas apenas seu mobiliador e decorador, José não é um pedreiro, como o Grande Arquiteto do Universo, mas um carpinteiro.
Não precisamos imaginar Nosso Senhor trabalhando em uma carpintaria; isso é só um exemplo da confusão e materialização introduzidas por aqueles que não entendem o símbolo.
A mãe de Jesus, então, era uma nobre dama da Judeia, uma descendente da casa real de Davi. Verdadeiramente Ela, que foi escolhida para uma honra tão alta, deve ter sido pura e verdadeira e de caráter impecável – uma grande Santa, pois ninguém mais poderia ter dado à luz um corpo tão puro, tão maravilhoso e tão glorioso.
Ela levou uma vida santa e divina, de terrível sofrimento (que Ela suportou com maravilhosa paciência e nobreza de alma), mas com suas consolações igualmente estupendas. Sabemos pouco sobre seus detalhes, só ocasionalmente vislumbramos algum na resumida narrativa de seus contemporâneos, mas foi uma vida que faríamos bem em imaginar para nós mesmos, um exemplo pelo qual podemos muito bem agradecer a Deus.
Esta vida A levou até grandes alturas – alto o bastante para tornar possível um curioso e formosíssimo desenvolvimento ulterior, que agora devo explicar.
Estudiosos da vida interna sabem que quando uma pessoa chega ao fim da parte puramente humana de sua evolução – quando o passo seguinte a elevará à condição super-humana de Adepto, para dentro de um reino tão definitivamente acima da humanidade quanto o homem está acima do reino animal, quando ela tiver atingido o propósito pelo qual foi tornada humana -abrem-se diante dela diversas linhas de crescimento, e ela pode escolher qual irá seguir.
Ocasionalmente, também, há condições em que esta escolha pode ser em certa medida antecipada. Não é o local de discutirmos as opções; basta aqui dizer que uma das possibilidades é se tornar um grande Anjo ou mensageiro de Deus – unir-se à evolução Dévica, como é chamada na índia. E esta foi a linha escolhida por Santa Maria, quando Ela atingiu o nível em que a encarnação humana já não Lhe era necessária.
Um vasto número de Anjos jamais foi humano porque sua evolução segue em uma outra linha, mas há Anjos que foram homens, e que em certo estágio de seu desenvolvimento escolheram seguir a linha Angélica, e esta é uma linha muito gloriosa, magnífica e auxiliadora. Assim Ela, que há dois mil anos carregou o corpo de Jesus a fim de que mais tarde ele pudesse ser assumido por Cristo, agora é um poderoso Anjo.
Muito de formoso entusiasmo e devoção foram derramados aos Seus pés ao longo dos séculos, milhares e milhares de monges e freiras, milhares e milhares de homens e mulheres sofredores, achegaram-se a Ela e expressaram sua dor, e oraram para que Ela por Sua vez apresentasse suas súplicas ao Seu Filho.
Este último tipo de prece é um equívoco, porque Aquele que é o Eterno Filho de Deus e ao mesmo tempo o Cristo dentro de nós não precisa de ninguém que interceda por nós junto a Ele. Ele sabe, antes de sequer falarmos, o que é melhor para nós. Nós estamos nEle, e fomos feitos através d’Ele, e sem Ele não teria sido criado nada do que foi criado, nem mesmo a menor partícula de pó de todo o universo.
Quem entende não reza pela intercessão de grandes Anjos, porque sabe que Ele, em quem vivem e se movem e têm seu ser todos os Anjos, já está fazendo o melhor que pode ser feito por cada um de nós. Mas assim como alguém pode pedir ajuda a um amigo encarnado – como alguém pode, por exemplo, pedir o encorajamento de seu pensamento – da mesma forma alguém pode pedir ajuda do mesmo amigo humano quando ele tiver deixado sua vestimenta de carne; e da mesma forma alguém pode pedir o mesmo tipo de ajuda a estes grandes Espíritos em seu nível superior.
Não há nada de irracional ou anticientífico nisso. Eu mesmo já recebi cartas de pessoas que sabem que eu estudei estes assuntos, contando que em tal e tal momento eles estariam sob alguma dificuldade – talvez uma operação cirúrgica, ou alguma outra provação – e pediram que eu pensasse neles naquele momento, e enviasse pensamentos de auxílio.
Naturalmente sempre o fiz. E como sei que não existe efeito sem causa, e exatamente da mesma forma não pode haver causa que não produza seu efeito, sei que se eu (ou qualquer um de vocês) tiver o trabalho de fixar o pensamento sobre alguém com problemas ou em dificuldades, e tentar enviar-lhe ideias auxiliadoras, tentar colocar diante dele algo que o fortaleça em seus problemas, podemos ficar perfeitamente certos de que a força-pensamento produzirá seu efeito, que ela viajará e agirá sobre aquela pessoa.
A extensão em que ela pode fazê-lo depende da receptividade da pessoa, da força do pensamento, e de várias outras circunstâncias; mas que produzirá algum efeito podemos ficar absolutamente certos. E assim, quando enviamos um pedido por pensamento amável, auxiliador e fortalecedor para um destes Grandes Seres – seja ele um Santo encarnado, ou já desencarnado, ou um dos grandes Anjos – seguramente aquela ajuda nos chegará, e nos fortalecerá.
Este é o caso da Mãe do Mundo, mas há aqueles que nos querem fazer acreditar que todo aqueles esplêndidos bons sentimentos, todo aquele amor e completa devoção, foram desperdiçados e foi tudo inútil. Por incrível que isso possa parecer a alguém acostumado a pensar em linhas mais largas e sãs, realmente imagino que em sua estranha ignorância eles são o pior dos inimigos da Igreja hoje em dia.
Eles vão ainda além, e dizem que é errado, mau e blasfemo para um homem sentir tal amor e devoção por Ela! Soa como loucura, mas temo que seja verdade que existam tais pessoas.
É claro que a verdade é que nenhuma devoção, nenhum amor, nenhum bom sentimento jamais foram errados, para quem quer que os tenha enviado. A devoção e o afeto muitas vezes têm sido prodigalizados sobre objetos indignos, mas isso não foi um erro de parte do doador -apenas uma falta de discernimento; sempre é bom para ele que se derrame em amor, pois com isso ela desenvolve sua alma.
Lembremos que se amamos qualquer pessoa, é o Deus interior nela a quem amamos; Deus em nós reconhece Deus nela; as profundezas clamam uma pela outra, e o reconhecimento da Divindade é sinônimo de felicidade.
O amante muitas vezes vê no amado qualidades que ninguém mais consegue ver; mas estas qualidades estão nele em estado latente, porque o Espírito de Deus está em todos nós, e a funda confiança e forte afeto do amante tende a invocar à manifestação aquelas qualidades latentes no amado. Aquele que idealiza outrem tende a fazer com que aquela outra pessoa se torne como ele imagina que ela seja.
Poderíamos então supor que toda a maravilhosa e bela devoção endereçada à Mãe do Mundo foi desperdiçada? Qualquer pessoa que pensa assim deve entender bem pouco da economia divina. Nenhum sentimento verdadeiro e santo jamais foi desperdiçado desde que o mundo começou, ou será até que ele acabe; pois Deus, que nos conhece a todos, dispôs que o menor toque de devoção, o menor sentimento de compreensão, o menor pensamento de culto, sejam sempre recebidos e atuem sempre até o máximo de suas possibilidades, e sempre tragam d’Ele uma resposta.
Neste caso Ele, em Sua benevolência, indicou a Mãe de Jesus como o grande Anjo que iria receber estas preces – para ser um canal para elas, para aceitar esta devoção, e encaminhá-la a Ele. Portanto a reverência que oferecemos a Ela, e o amor derramado a Seus pés, jamais nem por um momento foram desperdiçados; eles trouxeram seu resultado, fizeram seu trabalho.
Século após século os mais ricos tesouros da arte tiraram sua inspiração da beleza de Sua divina maternidade; Suas glórias têm sido postas na música mais magnífica; Sua sabedoria tem inspirado os maiores doutores e instrutores da Igreja, pois Ela é o Coração da Sabedoria, a Mãe do amor justo, da paciência e da perseverança e da santa esperança – Ela que guarda todas as palavras de Jesus em Seu coração.
Se tentamos entender, veremos o quanto a realidade é maior do que a estreita concepção de que todo pensamento elevado, todo o culto, todo o louvor não dirigido a algum Nome em particular deva se perder inevitavelmente. Por que Deus limitaria a Si mesmo por causa de nossos enganos a respeito de Seus nomes? Ele olha dentro do coração, e não para as palavras.
As palavras são condicionadas pelas circunstâncias externas – pelo lugar de nascimento, por exemplo. Somos Cristão porque aconteceu de nascermos na Inglaterra, ou na América, ou em algum outro país Cristão – e não porque examinamos e comparamos todas as religiões e deliberadamente escolhemos o Cristianismo. Somos Cristãos porque esta era a fé em meio à qual nos encontramos, e assim a aceitamos.
Já lhes ocorreu que se tivéssemos nascido na índia seríamos Hindus ou Islamitas de um modo igualmente natural, e derramaríamos nossa devoção a Deus sob o nome de Shiva, Krishna ou Allah em vez do nome de Cristo? Se tivéssemos nascido no Ceilão ou em Burma seríamos budistas ardorosos. O que estas considerações de local importam para Deus? É sob Sua lei de perfeita justiça, sob o seu esquema de evolução, que uma de Suas criaturas nasce na Inglaterra e outra na índia ou no Ceilão, de acordo com suas necessidades e merecimentos.
Quando qualquer homem derrama sua devoção, Deus a recebe através do canal que Ele indicou para aquele homem, e assim todos se satisfazem e é feita justiça. Seria uma injustiça grosseira e flagrante se a devoção honesta fosse perdida ou rejeitada. Jamais a menor fração dela foi rejeitada. Os caminhos de Deus são diferentes dos nossos, e Sua compreensão destas coisas é muito maior e mais vasta do que a nossa. Como Faber escreveu:
Pois tornamos Seu amor estreito pela falsa limitação nossa, e magnificamos Seu rigor com um zelo que Ele não mostra.
As histórias que ouvimos sobre a Mãe do Mundo podem bem ter seu fundo de verdade. Ouvimos sobre Ela aparecendo em vários lugares para várias pessoas – para Joana dArc, por exemplo. É muitíssimo provável que Ela ou Ele (pois em tão excelsas alturas não há nada semelhante a algo que pudéssemos chamar de gênero sexual) o tenha feito – que este grande Anjo de fato Se tenha mostrado. Não há nenhuma impossibilidade prévia nisso, e é altamente improvável que todas as pessoas que testemunharam estas aparições estivessem iludidas ou hipnotizadas, ou caído em algum estranho engano.
Todos os estudantes sabem que um intenso pensamento sobre qualquer assunto produz fortes formas-pensamento que permanecem muito próximas do limite da visibilidade; já foram criadas milhares de tais formas-pensamento da Senhora da Luz, e podemos estar certos de que Ela jamais deixou de responder e animá-las completa e eficazmente. É certo que, além disso, sob circunstâncias favoráveis algumas se tornam visíveis fisicamente, e mesmo quando permanecem astrais, as pessoas sensíveis muitas vezes podem vê-las. A terrível e inaudita tensão e ansiedade originadas pela Guerra Mundial tornou muitas pessoas sensíveis a impressões psíquicas que antes jamais perceberam. Assim acontece de ouvirmos tantas histórias de aparições bem agora, e as visões ou manifestações da Mãe do Mundo ocupam entre elas um lugar proeminente.
Diz-se ainda que através da fé n’Ela têm-se produzido curas maravilhosas em Lourdes e outros lugares. Provavelmente isso é fato. Não há nada de anticientífico nisso, supô-lo não cai fora do razoável e do bom-senso. Sabemos perfeitamente bem que uma forte efusão de força mesmérica produz certas curas; não temos conhecimento nenhum sobre os limites deste poder, mas é bom lembrarmos que todas estas coisas têm uma verdade por trás.
Assim, pois, foi Ela, a Senhora da Luz, quem enviou através de nossa Presidente (da Sociedade Teosófica) aquele maravilhoso Apelo às Mulheres do Mundo. Em A Fraternidade de Homens e Anjos Geoffrey Hodson escreve sobre Ela:
Ela trabalha sempre pela causa da maternidade humana, e agora mesmo está empregando toda a Sua imensa força e chamando toda a Sua corte Angélica para trabalhar em prol da elevação da maternidade em todo o mundo.
Através de Seus Anjos mensageiros Ela mesma está presente em cada nascimento humano – invisível e ignorada, mas em verdade bastaria que as pessoas abrissem seus olhos e Ela se revelaria. Ela envia sua mensagem aos homens através da Fraternidade:
Em Nome d’Aquele a quem carreguei há muito tempo,
Eu venho em vosso socorro.
Tomei cada mulher em meu coração, para ali ter parte com ela,
para que através disso eu possa auxiliá-la em seu tempo de necessidade.
Elevai as mulheres de vossa raça até que as vejam, como Rainhas,
e para tais Rainhas cada homem seja um Rei,
para que possam ambos se honrar mutuamente,
percebendo a realeza um do outro.
Que toda casa, por menor que seja, se torne uma corte, cada filho seja um cavaleiro, cada infante seja um pajem.
Que todos se tratem mutuamente com cavalheirismo,
honrando um no outro a filiação régia, seu nascimento augusto,
pois há sangue real em todo homem:
SOMOS TODOS FILHOS DO REI!
Agora nos resta considerar como podemos nos valer deste privilégio de servi-La que Ela nos oferece; e também, tratar dos aspectos simbólicos da Mãe do Mundo.