A pessoa tem de aprender a produzir a separação de si mesmo, a separação de todas as coisas: aprender a não se identificar com os sucessos, com os acontecimentos, com os eventos, com as coisas.
A identificação absorve, vampiriza a consciência da pessoa e a submerge mais profundamente no sonho.
De forma que necessitamos que nossa consciência desperte, o qual é possível fazendo a separação entre nós e as coisas, entre nós e os eventos ou sonhos.
É claro que cada defeito descoberto na “escola” da vida prática deve ser trabalhado conscientemente, com o propósito de separá-lo de nossa psique.
Se ficamos sobre uma tábua e desejamos levantá-la para colocá-la arrimada em una parede, seria impossível esse trabalho enquanto continuarmos parados sobre ela.
Obviamente, devemos começar por separar a tábua de si mesmos, retirando-nos da mesma, para logo levantar a tábua com nossas mãos e colocá-la recostada no muro.
De maneira similar, não devemos nos identificar com nenhum “agregado psíquico”, se é que de verdade desejamos separá-lo de nossa psique.
Quem sempre se crê “uno” nunca será capaz de se separar de seus próprios “elementos indesejáveis”, pois considerará cada pensamento, sentimento, desejo, paixão, afeto, como funcionalismos diferentes e imodificáveis de sua própria natureza, e até se justificará dizendo que tais ou quais defeitos pessoais “são de caráter hereditário”.
Mas quem aceita a “doutrina dos muitos eus” compreende à base de observação que cada desejo, cada pensamento, ação, paixão, corresponde a este ou outro Eu distinto, diferente.
Qualquer “atleta” da auto-observação íntima trabalha muito seriamente dentro de si mesmo e se esforça por “apartar de sua psique” os “elementos indesejáveis” que carrega dentro.
Se a pessoa, de verdade e muito sinceramente, começa a observar-se internamente, acaba dividindo-se em dois: “observador” e “observado”.
Se tal divisão não se produzisse, é evidente que nunca daríamos um passo adiante na senda maravilhosa do Autoconhecimento. Como poderíamos observar a nós mesmos se cometêssemos o erro de não querer nos dividir entre “observador” e “observado”?
Indubitavelmente, quando essa divisão não ocorre, continuamos identificados com todos os processos do “eu pluralizado”. Quem se identifica com todos os processos do “eu pluralizado” é sempre vítima das circunstâncias.
Como poderia modificar circunstâncias aquele que não conhece a si mesmo? Como poderia conhecer a si mesmo quem nunca se observou internamente? De que maneira poderia alguém se auto-observar se não se divide em observador e observado?
Bem, ninguém pode começar a cambiar radicalmente, enquanto não seja capaz de dizer “este desejo é um eu animal que devo eliminar”, “este pensamento egoísta é outro eu que me atormenta e que necessito desintegrar”, “este sentimento que fere meu coração é um eu intruso que necessito reduzir a poeira cósmica”…
Naturalmente, isso é impossível para quem nunca se dividiu entre observador e observado. Quem toma todos os seus processos psicológicos como funcionalismos de um eu único, individual e permanente se encontra tão identificado com todos os seus erros, os tem tão unidos a si mesmo que perdeu a capacidade para separá-los de sua psique.
Obviamente, pessoas assim jamais podem mudar radicalmente… são pessoas condenadas ao mais rotundo fracasso.